quinta-feira, 9 de outubro de 2008

GOIABA VIRA COMMODITY AMBIENTAL EM CAMPOS E REGIÃO

Royalties do petróleo para o financiamento da goiaba como “commodity ambiental” em Campos dos Goytacazes - RJ.
9/10/2008
Por Talita Pereira*
Da forma indiscriminada com que o ser humano utiliza os bens da natureza, como as florestas e os recursos hídricos, é impossível manter o Planeta preservado e garantir a segurança e a dignidade das mais diferentes espécies. Os indícios do esgotamento dos recursos naturais, crises energéticas e desequilíbrios ambientais eram claros já na década de 60. Conferências internacionais, tratados ambientais, organizações não-governamentais, a utilização de fontes de energia renováveis, a reciclagem, entre outros, surgiram como conseqüência da crescente consciência ambiental da população. Estava claro que a queima de combustíveis fósseis, a devastação das florestas, o uso indiscriminado da água, entre outras agressões ecológicas, atingiam a todos, sem distinção e fronteiras.
A indústria do petróleo brasileira, desde a criação da PETROBRAS (Lei n.º 2.004/53) até os recentes descobrimentos de novas bacias petrolíferas, apresenta incontestável potencial para a inovação nos diferentes setores da indústria, na geração de ocupação e renda resultando assim, em desenvolvimento econômico. Além do desenvolvimento econômico e social as localidades afetadas têm um aumento significativo de sua receita.
O dinheiro arrecadado por meio de recursos oriundos da indústria do petróleo (royalties) é repassado aos Estados e Municípios que exploram, refinam ou distribuem o produto. Os royalties, segundo o artigo 11 do Decreto n.º 2.705/98, são uma compensação financeira devida pelos concessionários de exploração e produção de petróleo e gás natural, a ser paga mensalmente pela empresa exploradora ao governo. O controle e a distribuição desses recursos estão sob a responsabilidade da Agência Nacional do Petróleo (Lei n° 9.478/97). São beneficiários destes recursos, ao nível federal, o Comando da Marinha, os Ministérios da Ciência e Tecnologia, das Minas e Energia e do Meio Ambiente, além de 10 Unidades da Federação e cerca de 800 municípios. No entanto, pouco se sabe a respeito da aplicação que esses beneficiários do poder público fazem desses recursos.
De acordo com a emenda Constitucional n° 9 e a Lei n° 9.478/97 a destinação do uso dos royalties nos Estados e Municípios não é restrita à energia, pavimentação de rodovias, abastecimento e tratamento de águas, irrigação, proteção ao meio ambiente e saneamento básico. Cabe então às Administrações Estaduais e Municipais a utilização racional e transparente dos royalties, já que a legislação não determina as áreas em que tais recursos devam ser empregados. Ainda, vale ressaltar que o valor desses recursos está sujeito a oscilações de acordo com o preço internacional e a taxa de câmbio. Portanto, a possibilidade de transformar tais compensações em geração e estímulo para diferentes atividades é de suma importância.
Numa perspectiva em longo prazo, tais compensações devem garantir a continuidade do crescimento econômico, a sustentabilidade da economia local e melhorias na qualidade de vida da população já que o petróleo é um recurso natural finito. A melhoria na qualidade dos serviços relacionados à saúde e educação pública, lazer, meio ambiente e fortalecimento dos setores produtivos de cada região podem ser citados como exemplos.
Uma alternativa para o destino seguro dos royalties de petróleo e gás natural seria a aplicação em projetos de “commodities ambientais”. Os recursos seriam aplicados diretamente em projetos com objetivos relacionados à sustentabilidade econômica e ambiental, tendo como conseqüência a geração de ocupação e renda aliadas à preservação ambiental. O conceito e a expressão "commodities ambientais" nasceu no Brasil, em função da busca de um novo modelo econômico que pudesse privilegiar as riquezas naturais e a propriedade intelectual (cultura dos povos, artes, qualidade de vida, pesquisas e valores abstratos originados da capacidade humana).
As "commodities ambientais" são mercadorias originadas das matrizes: água, energia, biodiversidade, madeira, minério, reciclagem e controle de emissão de poluentes (água, ar e solo) e diferenciam-se das convencionais por serem produzidas com manejo sustentável, aliando a conservação ambiental para uma economia justa, socialmente digna e politicamente participativa e integrada. As “commodities ambientais” não são somente um modelo alternativo de desenvolvimento sustentável, mas sim o resgate de princípios e valores, em que se busca a inclusão social sem o assistencialismo e a dependência conhecidos no modo tradicional. O Projeto B.E.C.E. (Brazilian Environmental Commodities Exchange, sigla em inglês para Bolsa Brasileira de Commodities Ambientais) foi o pioneiro na conceituação e difusão da importância do desenvolvimento das "commodities ambientais" . Criado em 1996, por Amyra El Khalili, o projeto tem como proposta desenvolver um modelo econômico mais justo e solidário, com base no tripé educação, informação e comunicação.
Em 2006, o Brasil ocupou a 17ª posição no ranking mundial quanto às reservas provadas de petróleo. No mesmo ano, o Estado do Rio de Janeiro respondeu por 80,1% das reservas provadas de petróleo, com destaque para a Bacia de Campos, no norte do Estado. O município de Campos dos Goytacazes é o maior do interior do Estado do Rio de Janeiro, (localizado na região Norte Fluminense) com uma área de 4.037 km2 e população de 406.989 habitantes (IBGE, 2000). A indústria petrolífera representa o maior volume da economia do município, mas é importante destacar o potencial que envolve a agroindústria, a pesca e a indústria cerâmica.
Em 1997, trabalho realizado pela Fundação Getúlio Vargas confirmou a vocação agroindustrial da região. Estudos voltados especificamente para a localidade mostraram a viabilidade da fruticultura irrigada como atividade complementar àquelas já praticadas. Por suas características técnicas pode ser praticada em pequenas áreas, permitindo aos produtores complementar e diversificar atividades tradicionais, ao invés de substituí-las. A atividade pode contribuir para aumentar a rentabilidade dos produtores da região e ocupar, de forma racional, a mão-de-obra familiar disponível. Culturas como abacaxi, caju, coco e goiaba, entre outras frutíferas foram citadas em destaque.
O cultivo da goiabeira representa importante papel no desenvolvimento socioeconômico no Estado do Rio de Janeiro, com mais de 300 produtores dedicando-se à atividade. Em 2005, o Estado foi o quinto maior produtor nacional, sendo a região Norte Fluminense responsável por, aproximadamente, 25% dessa produção (IBGE, 2007). A goiaba é um fruto de fácil agregação de valor econômico (Rozane et al., 2003) e o retorno do investimento ocorre a partir do terceiro ano após o plantio (Agrianual, 2005). A importância econômica real da cultura existe devido às amplas formas de aproveitamento. Os frutos da goiabeira tanto podem ser consumidos in natura ou empregados na produção de doces, suco, geléia, sorvete. É uma fruteira importante do ponto de vista social por ser geradora de empregos no meio rural e industrial, sendo estes ainda por períodos mais longos (Ide et al., 2001).
A cultura requer a participação de muitos pequenos produtores, principalmente quando os frutos são para consumo ao natural. A produção de goiaba é típica de pequenos produtores, inclusive para a finalidade industrial (Vegro e Miranda, 1994), devido à exigência de constantes podas e de irrigação, o que torna onerosas as grandes áreas. As possibilidades de expansão da cultura da goiabeira no Norte Fluminense são bastante favoráveis, tendo em vista o crescimento da demanda da fruta pelas indústrias de processamento e envasamento de suco. O município conta também com excelentes características relacionas à água, clima, solo e escoamento de produção. Os frutos contêm um dos mais altos teores de vitamina C, além de vitamina A, cálcio, tiamina, niacina, fósforo, ferro, beta-caroteno e licopeno. A espécie é também utilizada como medicinal, no reflorestamento de áreas degradadas, no restabelecimento do ciclo hidrológico, nos serviços ambientais como seqüestro de carbono e pode ser inserida, ainda, em sistemas agroflorestais. Uma proposta para o município de Campos dos Goytacazes e região seria a de destinar parte dos royalties do petróleo arrecadados para promover o desenvolvimento e a atualização da fruticultura, mais especificamente, da cultura da goiaba.
Os recursos dos royalties poderiam ser aplicados em cursos de capacitação para os empreendedores, em financiamento de insumos para plantio, em infra-estrutura para processamento da fruta, entre outros projetos para a cadeia produtiva. Assim, a localidade tem a possibilidade de transformar a riqueza auferida com os royalties do petróleo e gás natural em fomento a dinâmicas sustentáveis, de modo a prevenir o declínio econômico decorrente da exaustão das reservas de hidrocarbonetos. Estes recursos poderiam ser direcionados a investimentos em atividades já existentes, identificadas como relevantes e consistentes, bem como em novas atividades em potencial. Ainda, o diferencial na exploração da cultura como fruta fresca ou na produção de doce é devido à relação intrínseca com a história e cultura local, o que facilita seu desenvolvimento.
Talita Pereira - Eng. Agrônoma - Doutora em Ciências Naturais pela UENF e Pós-graduada em Direito e Gestão Ambiental, pela Faculdade de Direito de Campos. pós-graduada em Direito e Gestão Ambiental, pela Faculdade de Direito de Campos, CTA (Consultants, Traders and Advisors - Geradores de negócios Socioambientais nos Mercados de Commodities). Autora do trabalho monográfico: "Royalties de petróleo para o financiamento da goiaba como "commodity ambiental" em Campos dos Goytacazes - RJ", orientada pela Profª Economista Amyra El Khalili. email: talita_p@yahoo.com.br

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